"Sangue Tipo D, de Dança"

Catarina Aires tem 25 anos e é natural do Porto. Atualmente, é professora de dança em três diferentes academias e está a terminar a licenciatura em Ciências da Comunicação, na Universidade Lusófona do Porto, a combinação perfeita entre a dança e a comunicação. É apaixonada pelo canto, pela leitura. Ama estar com os seus amigos e com a sua família.
A dança está na sua vida desde que se lembra. "Uma vez, até me ri com uma amiga minha, a Carolina Gil, porque dizíamos que nascemos com um tipo de sangue, tipo D, de dança", lembra. Aos seis anos, os seus pais decidiram colocá-la na Academia de Bailado Pirmin Treku, no Porto.
Permaneceu na academia até aos catorze anos. Aos quinze, decide fazer uma audição para entrar no Conservatório Nacional de Dança, em Lisboa. "Eu era o número 115. Fui numa de experiência. Cheguei lá e tinha fatos de ballet, collants e sapatos para fazer a audição, mas por acaso eu tinha ido a uma loja de ballet, perto do Conservatório, onde me disseram que aquele fato não era o adequado. Então, acabei por comprar um fato branco e uns sapatos que eram os adequados. Acho que de certa forma também me ajudaram para causar uma melhor impressão na audição", conta.

"Sentir beleza com algo que vem de dentro e não só com a beleza que vem de fora"
Esse dia foi bastante marcante para Catarina. Foram quatro horas de audição. Consoante a passagem do tempo, iam saindo várias pessoas. No final, ficaram duas. "Tinha que agarrar esta oportunidade", confessa. Com apenas quinze anos embarcou nesta aventura. Saiu do Porto e foi viver sozinha para Lisboa.
Toda esta mudança foi uma novidade para a jovem. Até então, a dança era um hobby que adorava. Completou o 11º e 12º ano no Conservatório, conseguindo o diploma. Tinha a formação para ser professora. Formou-se em Ballet Clássico, técnica Vaganova russa, em Contemporâneo, com influências em Martha Graham e formou-se em improvisação. "Também fiz formação em dança de caráter, sapateado e fizemos vários espetáculos, onde a criação de coreografias nos era ensinada. Era uma ferramenta que nos estava, constantemente, a ser ensinada. Saber criar, saber improvisar", diz.
Mas, Catarina estava pronta para ir para a Universidade de Artes Performativas. Terminado o Conservatório, ingressou em várias escolas, nomeadamente na Juilliard, na M.D.A em Nova Iorque e Los Angeles, mas por motivos monetários e pela proximidade com a família, acabou por entrar para a Universidade de Artes, a Codarts, em Roterdão. "Entrei com uma bolsa de mérito", conta.

A jovem aprendeu muito. Conseguiu evoluir a sua técnica contemporânea, a improvisação e a criação. Aprendeu as ferramentas necessárias para criar a sua própria linguagem corporal, saber montar um espetáculo e uma coreografia. Evoluiu em Artes Dramáticas, no sentido do Drama e do Teatro. Foi-lhe ensinado a saber gerir as suas próprias emoções, a saber usar o palco.
Foi lá que começou a sua formação, mas devido a uma lesão e a um grande distúrbio alimentar, no final do segundo ano, teve que desistir e regressar a Portugal. "Pensava que iria acabar por voltar e acabar o curso de Artes Performativas, mas não consegui. Comecei uma vida do zero em Portugal. Voltei a reajustar-me à minha família e a sair dos hábitos que de certa forma tinha desaprendido. Estava há cinco anos fora e num ambiente muito artístico", explica.
Catarina acabou por colocar a dança em segundo plano e começou a tirar o curso de Ciências Comunicação.

Foi ainda no seu regresso que Catarina percebeu a importância de um bailarino ter a energia certa para conseguir dançar. "Como também tive o distúrbio, e às vezes, ficava sem energia, fiz um curso de cozinha na escola de hotelaria e turismo do Porto e mais tarde, um estágio onde trabalhei com comida saudável e, mais tarde, um workshop intensivo de dança para professores. Todo este percurso foi muito importante e interessante", afirma.
"A dança é uma forma de expressão!"
Começou por saber melhor o que o músculo precisa, quais os alimentos essenciais para conseguir refletir uma melhor energia para quando está a dançar. A jovem tem vindo a aprender muito.
É professora há três anos. Decidiu alugar um estúdio e começar a dar aulas privadas. "Tudo aconteceu muito de repente. Estava todos os dias a dançar sozinha. Pensei o porquê de não partilhar o meu conhecimento", conta.
Através de um contacto, começou a dar aulas a uma pessoa. Passado algum tempo, conseguiu criar interesse em mais cinco pessoas. Começou a dar aulas a essas cinco, mas por causa do curso de Comunicação, não conseguia ter muito mais horário.
Mais tarde, ao visitar a Escola de Ballet Cuca Anacoreta, no Porto, descobriu que precisavam de alguém para dar ballet adulto e aula de flexibilidade e fortalecimento muscular a meninas mais novas. "Comecei a dar aulas uma vez por semana e correu muito bem. Comecei a dar aulas também na academia Mydance, na Maia, onde dou ballet kids e contemporâneo a jovens. Desde então, tenho vindo a subir as minhas aulas privadas. É assim que me tenho mantido", diz.

Nas suas aulas, as mulheres desenvolvem a relação com elas próprias e com a música. "Eu dou quase uma danço terapia. O meu objetivo nestas aulas é de contar histórias com o corpo, histórias com o movimento", afirma.
A jovem tem como inspiração a bailarina Svetlana Zakharova, uma das melhores bailarinas do mundo do Ballet Clássico. "Eu tinha doze anos e estava em casa. Tinha uma barra e um espelho no quarto. Lembro-me de estar em espargata a ver um vídeo dela a dançar, no youtube, e comecei a chorar. A delicadeza dela, a beleza, a leveza com que ela fazia os passos, colocava as pontas. Eu só me lembro de dizer que queria ser como ela", conta.
Marcelino Sambé e Benvindo Fonseca também são destacados por Catarina. "São bailarinos excecionais. A alma que colocam nos trabalhos é inexplicável", afirma.
Enquanto Catarina, a sua primeira grande inspiração é Deus. A jovem acredita em Deus. Para si representa amor. "As cores, a textura, a vida, o vento, o mar, o oceano, o movimento da vida diária, os sons, as pessoas e as suas expressões, os abraços, as tristezas, tudo que vamos vivendo me convida a dançar. Deus é, de facto, a minha grande inspiração", reflete.
Catarina reflete sobre a importância de criar todo um espetáculo e, também, da simplicidade que a dança transmite. "A criação de um espetáculo traz-nos novas ferramentas em todo o sentido. Faz-nos perceber a importância da luz, do som, das imagens, dos figurinos, do cenário", enumera.

O dar algo a uma plateia é um dos objetivos do espetáculo. Por outro lado, a simplicidade é, também, muito importante. "Dançar como se ninguém nos estivesse a ver. Dançar porque nos apetece. Não dançar para alguém, mas só dançar por si", afirma.Conjugando com a dança, atualmente, Catarina está a terminar a licenciatura em Ciências da Comunicação. A comunicação está em tudo. "Nos nossos gestos. Tudo o que fazemos é, mesmo que seja inconscientemente, uma forma de comunicar algo. A dança não foge a isto", salienta.
A dança é outro canal de comunicação. A jovem afirma que através da dança conseguimos comunicar muita coisa que, provavelmente, por palavras, não nos é tão fácil. "A dança é uma forma de expressão!".

Com o curso sentiu-se mais capaz de criar e fazer uma junção entre a dança e a arte multimédia. "Tenho um especial gosto em criar conteúdo artístico através da câmera e da edição. É muito importante ter as ferramentas certas para o saber fazer", diz.
Catarina descreve-se como uma bailarina perfecionista, determinada, esforçada e muito curiosa. Sempre com vontade em aprender mais e a explorar mais o seu corpo, as suas emoções e o que há de mais profundo dentro de si. "De modo a tentar que esse profundo também seja puxado e trazido para fora", acrescenta.
Confessa ser uma bailarina que procura muito a beleza. Sente que através da dança tenta exprimir o seu agradecimento pela vida.
"Dançar como se ninguém nos estivesse a ver. Dançar porque nos apetece. Não dançar para alguém, mas só dançar por si"
"Não consigo lidar bem com a competição. Não sou uma bailarina que consiga sentir isso. Essa foi uma das razões de ter desistido e de não ter aguentado a carreira em si", conta.
Hoje, olha para a dança de uma forma diferente. "É interessante ver como uma pessoa se pode transformar. Consigo ver-me em todas as descrições que fiz e, hoje, sinto-me mais leve, menos preocupada com a imagem, com a beleza que transmito para os outros. Sentir beleza com algo que vem de dentro e não só com a beleza que vem de fora", afirma.

Para Catarina, a dança significa amar a vida através do movimento. Significa viajar, significa libertação, sabedoria, olhar para dentro. Absorver tudo o que vem do exterior, da rua, de casa, da relação com as pessoas. Conseguir trazer tudo o que vem de fora para o movimento da dança.
"Dançar tudo aquilo que me vai moldando. Dançar para mim significa comunicar com algo que me transcende".
Créditos:
https://www.instagram.com/catarinaires/?hl=pt